Luzes e Tecnologia
NOESIS NOS MEDIA
22 fevereiro 2023

Liderar uma Equipa com 5 Horas de Diferença no Fuso Horário


Ricardo Rocha está a liderar o negócio da Noesis nos EUA, mercado onde a tech portuguesa quer crescer mais de dois dígitos ao ano, ao mesmo tempo que coordena a equipa de marketing em Portugal


Por Ricardo Rocha, US Managing Director & Head of Global Marketing

A tecnológica portuguesa Noesis está apostada em fortalecer-se no mercado dos EUA, tendo nomeado no passado mês de setembro Ricardo Rocha, antigo diretor de marketing e comunicação da empresa para coordenar todo o negócio no continente americano.

Ricardo Rocha, que se mudou para os Estados Unidos, para Raleigh, na Carolina do Norte, aborda as metas que a Noesis pretende alcançar no plano internacional e partilha aqueles que têm sido os seus maiores desafios nesta nova fase da sua carreira profissional, bem como os novos conhecimentos que tem adquirido e ajudado face a uma realidade distinta que está atualmente a viver.

Isto porque, sendo um novo número 1 da equipa dos EUA da Noesis, o gestor português continua a liderar a equipa de Marketing e Comunicação da consultora tecnológica à distância, com cinco horas de diferença em termos de fuso horário. Ricardo Rocha fala das exigências que esta sua nova experiência está a acarretar.

Está nos EUA a liderar a Noesis, mas, ao mesmo tempo, coordena a equipa de marketing e comunicação da empresa em Portugal. Quantos elementos coordena num lado e no outro do Atlântico e como é que gere estas duas tarefas, sendo que uma delas tem de ser feita à distância?
Ricardo Rocha (RR): 
A nossa equipa de marketing é composta atualmente por 12 pessoas e tem a missão de gerir a marca Noesis e todas as atividades de go-to-market nos 6 países onde operamos – Portugal, Espanha, Irlanda e Reino Unido, Holanda, Brasil e Estados Unidos. Para além do foco na marca e no negócio, é também um pilar fundamental da definição e implementação da nossa estratégia de Employer Branding, especialmente focada em Portugal, onde está sediada a grande maioria dos nossos mais de 1000 colaboradores e o nosso principal mercado de recrutamento de novo talento.

A nossa visão para o marketing é que tenha, cada vez mais, uma implantação global, ainda que toda a equipa esteja, neste momento, sediada em Portugal. Em 2023 o investimento de marketing será, pela primeira vez, superior nos mercados internacionais em relação ao mercado nacional. O marketing acompanha a estratégia de internacionalização da Noesis, como não poderia deixar de ser. Não exclui, até que, no futuro, a equipa de marketing possa ter elementos espalhados pelas diferentes geografias onde estamos.

Nos Estados Unidos, 2022 foi um ano de investimento e de aposta na consolidação da nossa estrutura local, que se pretende continuar ao longo de 2023.  Atualmente a estrutura nos Estados Unidos é composta por quatro elementos, à qual se juntará mais um elemento, durante o primeiro trimestre de 2023.

A minha missão nos Estados Unidos passa por concretizar esta consolidação da estrutura local e, ao mesmo tempo, impulsionar o nosso negócio na região. Temos vindo a crescer consistentemente desde 2017 (ano em que nos instalamos nos Estados Unidos) e a perspetiva com este investimento local é que possamos acelerar esse crescimento, nos próximos 2-3 anos.

Como é liderar a equipa portuguesa à distância, dado que é feita noutro fuso horário?
RR: 
A equipa de marketing está toda baseada em Portugal, mas tem uma responsabilidade global, em estreita ligação com os responsáveis e equipas de cada mercado, com os responsáveis das nossas diferentes ofertas e alinhado com toda a estratégia da organização. O facto de toda a equipa estar em Portugal, é circunstancial e consequência da evolução/contexto da empresa. Somos uma consultora tecnológica internacional, mas que nasceu e foi fundada em Portugal. Atualmente, o tema da dispersão geográfica é uma realidade em muitas empresas, multinacionais e globais. Não é estranho trabalhar-se com colegas que estão noutras geografias, faz parte do mundo global e do contexto de aceleração e transição digital em que vivemos.

“A confiança é o alicerce, a que se junta responsabilidade e empowerment da equipa”.

No nosso caso, não poderia ser diferente, é a ordem natural do nosso crescimento e evolução. Inicialmente “estranha-se”, mas mais tarde ou mais cedo “entranha-se”. Encaro esta realidade, com toda a naturalidade. A liderança, neste contexto, tem, obviamente, desafios diferentes de liderar uma equipa com quem estamos, fisicamente, no dia a dia. A base, no entanto, é a mesma: é necessário ter uma boa equipa, com bons profissionais. Essa tem de ser a premissa. Ter uma equipa preparada e dimensionada para os objetivos e ambição da organização. A confiança é o alicerce, a que se junta responsabilidade e empowerment da equipa. Na gestão moderna não há lugar para o micro-management, ou para uma liderança que tudo controla e decide. E num cenário de liderança “à distância”, ainda mais. Há que ter um modelo de responsabilidades e de governance muito claros, onde a equipa perceba que tem um amplo espectro de atuação, um elevado nível de autonomia, e se sinta confortável nesse espaço. Tem que ser claro o papel de cada um, dentro da equipa. E, claro, qualquer que seja o modelo de trabalho, é necessário avaliá-lo constantemente e, ajustar o que for necessário. Costumo dizer que, na nossa equipa, estamos na fase da “prova de conceito”, implementamos, experimentamos, avaliamos e evoluímos.

“Na gestão moderna não há lugar para o micro-management, ou para uma liderança que tudo controla e decide”

Como é um dia-típico seu?
RR: 
A minha rotina diária ainda é um “work in progress” dado que me mudei apenas há cerca de quatro meses para os Estados Unidos. Ainda estou a adaptar-me ao ritmo dos EUA, a procurar conciliar o melhor possível com os ritmos de Portugal, fuso horário e, não menos importante, dinâmicas familiares.

Todos os dias são diferentes, mas têm alguns traços comuns – começar cedo – tipicamente início o meu dia por volta das 6h00 para que possa também terminar mais cedo (16h30), para conseguir dedicar algum tempo à família e apoiar os meus filhos nesta adaptação a um novo país, idioma, escola, atividades extracurriculares, etc. Já adotei alguns hábitos tipicamente americanos, para além de começar cedo, faço questão de levar os meus filhos, de bicicleta, à escola (por volta das 07h30). Tipicamente não almoço (outro hábito americano). Como algo ligeiro, para não ter grandes interrupções até chegar a hora de os ir buscar à escola, novamente de bicicleta. As manhãs são, por isso, intensas. Com uma agenda carregada (até pela sobreposição de fuso horário com Portugal) e onde procuro ser o mais disciplinado possível na gestão da minha agenda, reuniões e tarefas. As tardes são, tipicamente, mais tranquilas, de planeamento, e mais focadas na atividade e negócio dos Estados Unidos.

Por outro lado, se num dia “normal” trabalho maioritariamente de forma remota, em casa, esta missão nos Estados Unidos acrescentou também o desafio de ter de viajar frequentemente, dada a dimensão do próprio país. Essa é outra grande diferença face à vida em Portugal. Para dar um exemplo, na última semana estive cinco dias em Portugal, para participar no Kick-Off da equipa de gestão da Noesis, entre outras atividades, e esta semana viajarei para Los Angeles e, mais tarde, para Filadélfia para participar em duas iniciativas que estamos a organizar, junto dos nossos clientes e potenciais clientes.  Duas cidades em costas opostas dos Estados Unidos e também elas com fusos horários distintos. É exigente, mas também muito motivador.

“Se num dia ‘normal’ trabalho maioritariamente de forma remota, em casa, esta missão nos Estados Unidos acrescentou também o desafio de ter de viajar frequentemente, dada a dimensão do próprio país”.

Que preocupações procura ter para garantir que a gestão da equipa portuguesa é eficaz?
RR: 
É necessário confiar na equipa que montei e no que preparámos para que este modelo possa funcionar. Essa é a minha principal preocupação, garantir que a “máquina” está oleada e que a equipa se sente confortável neste modelo. Não há um controlo, nem pode haver, de questões quotidianas e operacionais, nem é humanamente possível que eu possa estar a par de tudo o que está a acontecer, em detalhe. Por isso, é necessário ter um processo claro, competências e responsabilidades bem definidas e, claro, momentos de discussão, avaliação e definição da estratégia. O meu papel é ser um “orquestrador” dessa estratégia e da equipa e, em alguns momentos, ser um “desbloqueador” de problemas. No fundo, garantir que a equipa tem as condições necessárias para cumprir a sua missão.

“O meu papel é ser um ‘orquestrador’ dessa estratégia e da equipa e, em alguns momentos, ser um ‘desbloqueador’ de problemas”.

A pandemia tornou natural o teletrabalho e as reuniões através de plataformas vídeo. O confinamento global agilizou este tipo de trabalho?
RR: 
Claramente. A pandemia veio acelerar o modelo de trabalho flexível, e o conceito do “work from anywhere”. É paradoxal que tenha sido uma situação de crise e de dificuldade a desbloquear aquilo que era uma visão de futuro, e a transformá-la numa realidade bem presente. Claro que sempre houve equipas multinacionais, deslocalizadas e trabalho remoto, mas, provavelmente, um papel como o que assumo atualmente seria muito mais difícil de acontecer há 4 ou 5 anos.

“A pandemia veio acelerar o modelo de trabalho flexível, e o conceito do ‘work from anywhere’”.

Relativamente à gestão da equipa norte-americana: como encaram o facto de ser um português a estar no comando da Noesis nos EUA?
RR: 
Com muita naturalidade. Provavelmente, ser uma empresa de origem portuguesa ajuda a que este cenário seja natural. Por outro lado, é uma equipa que estamos a construir e que já foi reforçada após a minha chegada. Quando cheguei, contratámos mais um elemento, local, para a nossa equipa comercial. Foi escolhido e contratado por mim, por isso, entrou na equipa já com este cenário e com toda a tranquilidade. O nosso próprio modelo de negócio também ajuda bastante, operamos num modelo de entrega baseado numa abordagem Nearshore, ou seja, a grande maioria dos nossos recursos técnicos especializados estão baseados nos nossos Centros de Competência em Portugal e também no Brasil. Os serviços que oferecemos aos nossos clientes, nos diferentes mercados em que operamos, bem como os projetos que desenvolvemos e implementamos, são baseados neste modelo. Isto significa que as estruturas locais estão em constante contacto com as equipas de Portugal, e o sucesso dos projetos que entregamos depende dessa estreita colaboração.

Por último, o facto de já ter um percurso na Noesis aliado ao facto de ter sido, anteriormente, Diretor de Marketing, já com uma responsabilidade global foram facilitadores do processo. No que toca aos Estados Unidos, já todos nós conhecíamos e já trabalhávamos em conjunto na definição da estratégia de desenvolvimento de negócio no mercado norte-americano. Assim sendo, a transição para assumir a liderança da operação nos Estados Unidos foi muito tranquila e natural.

Que desafios tem sentido na sua adaptação aos EUA?
RR: 
Encontrar o ritmo de trabalho perfeito e o correto balanço e equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Estamos a falar de uma grande mudança, em família, e com um grande desafio profissional associado. Encontrar o equilíbrio perfeito entre, por um lado, garantir que toda a adaptação e mudança de país corre bem e, ao mesmo tempo, que criamos as bases para que os resultados no negócio correspondam às expectativas da administração, nem sempre é fácil e é um processo de aprendizagem, com dias bons e menos bons.

Há diferenças em termos de recursos humanos e da sua gestão, entre a equipa com que trabalhou e trabalha em Portugal e a que dirige nos EUA? Em caso afirmativo, pode dar exemplos?
RR: 
Sim, há diferenças culturais, claro, e é fundamental ter especial atenção a esses detalhes. O tempo que levo na função ainda não me permite tirar grandes conclusões, mas notam-se algumas diferenças de contexto. Diria que há fatores culturais associados à forma como se trabalha em Portugal e nos Estados Unidos, mas precisarei de mais alguns meses no terreno para conseguir dar exemplos concretos.  

Tendo por base esta sua experiência no estrangeiro, que conselhos daria a um empreendedor que equacionasse investir nos EUA?
RR: 
Não estou em posição de dar grandes conselhos, até porque não sou nem empresário, nem empreendedor. Sou um gestor o que, apesar de tudo, é diferente. Ainda assim, nesta (ainda) curta estadia dá para perceber que há oportunidades e que a escala é radicalmente diferente. Tudo aqui é numa escala diferente, muito maior. As oportunidades de negócio, a dimensão das empresas, os potenciais clientes e negócios, a concorrência, a capacidade de investimento, os orçamentos, mas também o nível de exigência. Para desenvolver negócio nos Estados Unidos, é necessário ser-se muito bom. Ser diferenciador e ter um grande foco na qualidade do que se entrega, seja um produto ou serviço. Sim, o mercado é maior, sim há muitas oportunidades, mas não, não os negócios não aparecem só por existirmos. Da mesma forma que mais portas se podem abrir, também há muito mais players a tentar “entrar nessa porta” e, esta, rapidamente se fecha se não apresentarmos padrões de qualidade elevados. O mercado é muito concorrencial, ou temos realmente algo diferenciador para apresentar no mercado, e somos capazes de entregar com uma qualidade irrepreensível, ou rapidamente as oportunidades desaparecem e o mercado se “fecha”.

“Sim, o mercado nos EUA é maior, sim há muitas oportunidades, mas não, os negócios não aparecem só por existirmos”.

Quais os aspetos a ter em conta por alguém que pense em partir para os EUA?
RR: 
O processo de mudança, burocrático e legal não é fácil. Há algumas restrições à entrada e por isso todo o tema relacionado com o visto para trabalhar e viver nos EUA é complexo, demorado e “stressante”. No que toca aos aspetos mais quotidianos e de vida no país, diria que não é complicado, vivemos, apesar de tudo, em sociedades que têm mais semelhanças do que diferenças. Estamos culturalmente muito expostos, desde crianças, aos Estados Unidos. Viver aqui, é, apesar da grande mudança, algo “familiar”. Não há um choque cultural, a adaptação é fácil e rápida. Os Estados Unidos ainda são um país de oportunidades, onde se é possível fazer carreira e crescer tanto profissionalmente como em todos os aspetos.

Foi para os EUA para coordenar a operação americana da Noesis. Em concreto, que objetivos levou e que pretende concretizar?
RR: 
O principal objetivo é crescer e aumentar o nosso volume de negócios nos Estados Unidos. Esta função era inexistente até então e a nossa operação era gerida, remotamente, a partir de Portugal. Com esta nomeação passou a ser possível gerir a nossa operação localmente, nos Estados Unidos, garantindo uma gestão mais próxima, com o objetivo de acelerar o nosso ritmo de crescimento. O crescimento sustentado do volume de negócios, projetos e clientes nos últimos anos, nos Estados Unidos, criou a necessidade de assegurarmos uma estrutura local mais sólida e dimensionada, para acompanhar de forma mais próxima os nossos clientes e projetos. Queremos apostar fortemente neste mercado e explorar novas oportunidades de negócio.

“O crescimento sustentado do volume de negócios, projetos e clientes nos últimos anos, nos Estados Unidos, criou a necessidade de assegurarmos uma estrutura local”

A operação nos Estados Unidos está num ponto de maturidade e de dimensão em que, para continuar a crescer e dar um salto significativo, torna-se necessário investir e garantir esta presença local mais efetiva.  No plano a curto-prazo estava previsto o reforço da equipa comercial nos Estados Unidos, com a contratação de um recurso local dedicado ao Business Development, algo que já conseguimos. Também a aposta na realocação de perfis técnicos, de Lisboa, para os nossos escritórios em Raleigh, na Carolina do Norte, está a ser concretizada neste momento, com um primeiro recurso já instalado e com um segundo colaborador que se irá mudar a muito curto-prazo. Essa era uma das minhas missões iniciais, assegurar o cumprimento deste plano e a consolidação desta equipa/estrutura.

Como decorre o negócio nos EUA e quais são as metas definidas para 2023?
RR: 
O negócio nos Estados Unidos tem vindo a crescer de forma sustentada, ano após ano, desde 2017. Esse crescimento foi suportado, essencialmente, no desenvolvimento de projetos e prestação de serviços de uma das nossas ofertas, o desenvolvimento de software com Low-Code e com tecnologia OutSystems. A Noesis é um dos parceiros mais relevantes a nível mundial nesta tecnologia e, por isso, acompanhou a entrada da OutSystems no mercado americano, sendo um parceiro de referência para o desenvolvimento de projetos, junto dos clientes americanos que adotaram esta tecnologia. O Low-Code continua a ser uma das grandes tendências para os próximos anos, por isso é uma área onde continuamos a apostar e onde esperamos continuar a crescer. No entanto, o portfólio de oferta da Noesis é bastante mais completo. Somos uma empresa capaz de apoiar as organizações em praticamente todos os seus desafios de transformação digital, desde a Cloud, à Cibersegurança, Customer Experience, Automação, Inteligência Artificial, Analytics, Qualidade, etc. Um dos grandes objetivos é passarmos a prestar estes serviços também nos Estados Unidos, alargando assim o nosso espetro de atuação.

As metas para 2023 são ambiciosas – consolidar a estrutura local, introduzir novas ofertas no mercado e crescer, de forma acentuada, com um crescimento superior a 2 dígitos ao ano.

A expansão internacional da Noesis vai prosseguir? Quais são os próximos países onde querem chegar?
RR: 
A estratégia de internacionalização em curso está plasmada no nosso plano estratégico 2021-2023, que tem vindo a ser cumprido integralmente, em todos os parâmetros, estratégicos, operacionais e financeiros. Esse plano previa a consolidação da operação internacional, reforçando a aposta nos mercados onde a Noesis está presente, de forma sustentada e com o objetivo ambicioso de chegar ao fim de 2023 com a operação internacional a representar 40% do revenue total da Noesis. Os resultados de 2022 ainda não foram oficialmente apresentados, mas os dados de que dispomos apontam para que a operação internacional já represente mais de 35% do volume total de negócios. Significa isto que o objetivo dos 40% estão perfeitamente ao alcance e tudo leva a crer que será um objetivo cumprido.

O ano de 2023 será também o ano em que desenvolveremos o plano para o próximo triénio, no qual, certamente, a internacionalização continuará a ser uma das nossas alavancas de crescimento. No plano 2021-2023, não está prevista a abertura de novos mercados para a Noesis. Depois disso, dependerá do que for proposto e aprovado no próximo plano estratégico.  

Publicado na Forbes Portugal